A Câmara dos Deputados aprovou, na madrugada desta quarta-feira (10), o projeto de lei que altera a forma de cálculo das penas aplicadas a condenados pelos atos antidemocráticos de 8 de janeiro de 2023 e pela tentativa de golpe de Estado — mudanças que podem reduzir significativamente o tempo de prisão do ex-presidente Jair Bolsonaro e de outros integrantes do núcleo principal do caso. O placar foi de 291 votos favoráveis e 148 contrários, e o texto segue agora para o Senado.
A proposta aprovada é o substitutivo do deputado Paulinho da Força (Solidariedade-SP) ao PL 2162/23, de autoria do deputado Marcelo Crivella (Republicanos-RJ) e outros parlamentares. O relator retirou do texto original o artigo que previa anistia aos envolvidos no 8 de Janeiro, mantendo apenas mudanças na interpretação das penas e nas regras de progressão.
Pelo novo modelo, quando os crimes de tentativa de abolição do Estado Democrático de Direito e de tentativa de golpe forem praticados no mesmo contexto, deixa de haver soma das penas. Passa a valer apenas a pena mais grave — no caso, a tentativa de golpe, com previsão de 4 a 12 anos de reclusão. A regra pode retroagir para beneficiar condenados, conforme determina a legislação penal.
Quem pode ser beneficiado
Se virar lei, a mudança atingirá o grupo considerado estratégico na tentativa de golpe e já condenado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 25 de novembro:
Jair Bolsonaro, Almir Garnier, Paulo Sérgio Nogueira, Walter Braga Netto, Augusto Heleno, Anderson Torres e Alexandre Ramagem. As penas atuais variam de 16 a 24 anos de prisão.
O cálculo final ainda dependerá do STF, mas parlamentares da oposição avaliam que Bolsonaro, por exemplo, poderia ter o tempo de prisão em regime fechado reduzido de 7 anos e 8 meses para cerca de 2 anos e 4 meses.
Mudanças na progressão de regime
O projeto também altera regras da Lei de Execução Penal. Atualmente, um réu primário pode progredir de regime após cumprir 16% da pena, desde que o crime não envolva violência ou grave ameaça — condição que incide sobre os crimes relativos ao 8 de Janeiro.
O substitutivo acaba com essa restrição e permite a progressão em 16% mesmo para crimes com violência ou grave ameaça. Para reincidentes, a exigência cai de 30% para 20%.
Crimes contra a vida ou o patrimônio cometidos com violência permanecerão com a exigência de 25% da pena para progressão no caso de réus primários e 30% para reincidentes.
A redação também impacta outros crimes previstos no Código Penal que envolvem grave ameaça, mas não são considerados hediondos, como os de favorecimento à prostituição ou rufianismo, permitindo progressões mais rápidas.
Estudo e trabalho em prisão domiciliar
Outra mudança proposta autoriza que estudo ou trabalho realizados durante prisão domiciliar possam ser contabilizados para redução de pena — prática já admitida em decisões do Superior Tribunal de Justiça (STJ), desde que fiscalizável.
Pena reduzida em contexto de multidão
O texto prevê ainda que crimes de tentativa de golpe ou de abolição do Estado Democrático cometidos em contexto de multidão — como no episódio de 8 de janeiro em Brasília — tenham redução de pena entre um terço e dois terços, desde que o condenado não tenha financiado os atos nem exercido liderança.
Destaques rejeitados
Todos os destaques apresentados pelo PSB, PSOL-Rede e PT-PCdoB-PV foram rejeitados, incluindo tentativas de:
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manter o critério atual de 25% de cumprimento da pena para crimes cometidos com violência,
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impedir a redução por estudo ou trabalho na prisão domiciliar,
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retirar a aplicação apenas da pena maior nos crimes de tentativa de golpe e de abolição do Estado Democrático,
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excluir a possibilidade de redução de pena em atos cometidos em multidão.
O tema agora será analisado pelo Senado, onde o projeto poderá ser modificado antes de eventual sanção presidencial.
